“Estamos aquém do nosso potencial de crescimento”, diz presidente da Sinduscon/RN

Com o fim das obras estruturantes voltadas à Copa do Mundo, em 2014, e para as Olimpíadas no Rio de Janeiro, em 2016, aliado à crise nacional, o mercado da construção civil minguou. As perdas no setor em todo o país são bilionárias. No Rio Grande do Norte, no mesmo período, pelo menos 61 mil trabalhadores formais foram demitidos, construtoras encerraram atividades no estado e o mercado não vê novos empreendimentos há pelo menos dois anos. As empresas tentam esvaziar estoques antes de lançar novos edifícios ou condomínios horizontais, por exemplo.

Arnaldo Gaspar Júnior
Além disso, a questão dos distratos tem se tornado um calo para as empresas. Com a crise financeira, o volume de devoluções de empreendimentos aumentou e as construtoras tiveram que devolver recursos que não tinham aos compradores que acionaram a Justiça para ter acesso ao dinheiro. Pouco a pouco, porém, o cenário está mudando. Semana passada, cerca de 1.300 unidades habitacionais foram anunciadas dentro do Programa Minha Casa Minha Vida nas cidades de Natal e Mossoró. A retomada do crescimento do setor, porém, deverá ser lenta. As incertezas políticas e econômicas contribuem para isso.

Sobre esses temas, o presidente do Sinduscon/RN, Arnaldo Gaspar Júnior, fala a seguir. Acompanhe.

Do seu ponto de vista, como está o mercado da construção civil no Rio Grande do Norte? Há indicativos de melhorias ou a situação ainda pode ser considerada complicada?

A gente teve uma pequena melhora nos últimos dois ou três meses. O mercado está tão pequeno que o fato de algumas obras terem sido retomadas ou até iniciadas pelo Governo do Estado na Grande Natal, fez os números da construção civil melhorarem um pouco. Foram retomadas obras do Pró-Transporte, as obras do Saneamento Básico pela Companhia de Águas e Esgotos (Caern) em Natal. Elas estão a todo vapor e isso fez com que as contratações aumentassem nesse segmento de obras públicas. Temos ainda as obras do DNIT na entrada de Natal pela BR-101 Sul e também na BR-304 (Reta Tabajara). Isso deu uma ajudada. Na construção civil como um todo, se tem praticamente os estoques zerados, um curso de venda ainda razoável pois há uma retroalimentação dos estoques pelas devoluções. Muitas foram judicializadas e as questões estão sendo resolvidas e se tem, com isso, imóveis voltando para os estoques. É uma boa oportunidade para quem não comprou imóveis e pode adquirir dos estoques antigos, com preços menores. Mas, a retomada propriamente dita, com novas incorporações começando, a gente não vê ainda.

Há incertezas?

A gente tem incertezas no horizonte. Os distratos que estão sendo resolvidos, estão cada um sendo resolvidos de uma forma. E nem sempre essa forma é a mais justa para as empresas e isso gera uma insegurança jurídica. Se tem a incerteza do cenário político que está afetando a todos e deixa todo mundo num compasso de espera para saber o que virá. Basicamente, o índice de retomada está fragilizado. Há, mas ainda é muito pouco. Poderia estar num ritmo bem melhor.

Os bancos, inclusive, tentam atrair clientes com juros mais baixos e dilação de prazos de pagamento. Isso tem surtido efeito?

Tem havido alguns avanços por parte dos bancos, de um lado. Eles estão atuando de forma bastante próativa e, inclusive, a Caixa Econômica Federal atua com o Sinduscon/RN no Balcão de Negócios instalado no Midway Mall. Isso é muito positivo. Mas, por outro lado, os bancos estão mais severos em relação à análise de crédito. Isso porque estamos saindo de um período recessivo com alto índice de inadimplência, com alta devolução de imóveis. Se tem, com isso, algo paradoxal. De um lado, taxas competitivas e bancos com grana querendo participar do mercado, mas a área cadastral com muita parcimônia, ainda, na questão da liberação do crédito pro mutuário.

O senhor acredita que até o final deste ano o mercado ficará estagnado ou não?

Eu acho que a gente vai ficar nesse diapasão que estamos. Uma atividade econômica melhor do que no ano passado, sim, sem dúvida. Mas muito aquém do nosso potencial de crescimento. Muito aquém do nosso potencial da construção civil do Brasil como um todo e, do Rio Grande do Norte, em particular. Eu acho que isso irá continuar, independente do resultado das eleições, que afeta a todos nós. Porque a gente ainda não sabe o que vem por aí. Tanto de um lado quanto do outro, existem perguntas que só começarão a serem respondidas a partir de janeiro/fevereiro do ano que vem.

Nós vimos grandes empresas da construção civil deixarem o Rio Grande do Norte nos últimos quatro anos. Esse é um processo comum, o mercado local não é mais atrativo?

Veja bem: empresas muito grandes, que atuam no mercado nacional voltadas para o público Classe A, mas que no Rio Grande do Norte atuavam com imóveis para outras classes sociais. Não ofertavam imóveis de alto valor. Essas grandes empresas nacionais buscaram a renda média e, quando não, a renda baixa do Minha Casa Minha Vida, mas não a faixa zero. As faixas dois e três do Programa com empreendimentos na faixa dos 70 a 80 metros quadrados que são comercializados por até R$ 200 mil. Essas empresas, se financiaram na Bolsa de Valores com ofertas públicas de ações e estavam com muita grana e precisavam utilizar esse recurso. Então, elas saíram pelo Brasil inteiro produzindo imóveis, tratando-os quase como uma commodity e isso afetou o mercado como um todo. Isso gerou empregabilidade, aqueceu o mercado, fez a concorrência aumentar, etc.. Na crise, essas empresas se recolheram e saíram de quase todos os mercados do Nordeste e se concentraram no Centro-Sul do país. Isso acabou deixando o mercado local para as empresas locais ou, no máximo, as regionais. Basicamente, nosso mercado hoje está com empresas locais. Vamos esperar o que irá acontecer nessa retomada. Recentemente, o Rio Grande do Norte foi contemplado com imóveis inseridos no Programa Minha Casa Minha Vida a partir de uma seleção feita pelo Ministério das Cidades. Isso é muito bom. Mas sempre com empresas locais. Não há empresas de fora atuando. Será uma boa oportunidade para os empresários locais suprirem essa demanda. Eu espero que a gente consiga ter regras claras em relação às devoluções, em relação às obrigações de construtor e do comprador, e que isso seja pactuado pela sociedade e que ele seja respeitado.

Essa questão do distrato ainda é um grande desafio para a saúde financeira das construtoras?

Com certeza. Sem dúvida alguma. Os juízes de primeira instância do Rio Grande do Norte trataram as construtoras de uma forma como se nós estivéssemos produzindo televisões ou até mesmo pizza. O mercado é muito sério. Se isso não for mudado nos Tribunais Superiores, toda a sociedade pagará uma conta, pois afeta toda uma cadeia de produção. Do ponto de vista individual, a gente pode até achar justo que após o pagamento de 10 parcelas, por exemplo, o comprador desista e queira o dinheiro todo. Mas quais são as consequências disso? O contrato foi negociado com um banco, graças a esse contrato a empresa conseguiu vender e o banco fez o financiamento. As parcelas pagas foram investidas em mão de obra, concreto, em aço. O dinheiro não ficou guardado para ser devolvido. E na hora que a Justiça chega e manda devolver o dinheiro de uma vez só e com juros e correção monetária, isso traz um sério prejuízo para o empresários. E os próximos financiamentos terão um juro maior por causa do risco. Os bancos saberão que os contratos que estão assinados são irrevogáveis, poderão ser revogáveis. Então, isso gera um absurdo que só acontece no Brasil. A gente consegue que existem exceções. Uma pessoa perdeu o emprego, está numa situação limite, e pode ser compreensível. Mas tem situações que são investidores que, na época do ‘boom imobiliário ‘ compravam muitos apartamentos na planta e meses depois ou anos depois quando o prédio ficava pronto, vendiam mais caro, com alta taxa de lucro. São investidores que correm riscos e não podem ser tratados como o comprador de um único empreendimento, o imóvel sonhado. É um caso que analisamos com carinho. Mas não é o caso paradigma. A Justiça trata como iguais casos extremamente distintos e isso traz um prejuízo para a indústria da construção. Joga uma incerteza e uma insegurança absurdas.

O senhor vislumbra melhoria no cenário econômico nacional nos primeiros meses de 2019 ou será necessário mais tempo para essa retomada?

A gente está num momento muito delicado da nossa história, da nossa jovem democracia. Eu acho que quem ganhar vai ter uma responsabilidade muito grande. Se o PT ganhar, tem que entender que metade do Brasil não concorda com as suas ideias. Se a esquerda vier a ganhar, que faça uma mea culpa real. Eu gostaria tanto de ter uma esquerda mais responsável, que pudesse admitir que o Brasil não terá ou apoiará o caminho da Venezuela, por exemplo. Isso daria muita tranquilidade para os brasileiros que, hoje em dia, estão do outro lado. Ao mesmo tempo, se ganhar a direita mais radical, que é o que parece que irá para o segundo turno com a esquerda, que ela entenda que também não tem aprovação total do País. Muitas coias que a esquerda trouxe como a inclusão social, como a solidariedade social, isso precisa ser respeitado e preservado porque metade do País não pensa como a extrema direita pensa. Então, eu acho que é uma responsabilidade muito grande e esses dois campos, representandos por Haddad e Bolsonaro. Eu espero que eles tenham essa maturidade. E que sinalizem que não irão governar somente para sua turma, mas para um país inteiro. Essa união deve ser perseguida e conseguida.