Presidente da Itália envia carta a Temer para agradecer decreto de extradição de Battisti
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O presidente da Itália, Sergio Mattarella — Foto: Reuters
O presidente da Itália, Sergio Mattarella, enviou uma carta ao presidente Michel Temer agradecendo ao chefe de Estado brasileiro pela decisão de assinar o decreto que determina a extradição do italiano Cesare Battisti ao país europeu.
Na carta divulgada no Twitter pelo governo italiano, Mattarella afirmou que o gesto de Temer é “um testemunho significativo da amizade antiga e sólida entre o Brasil e a Itália”.
O presidente da Itália ressaltou na mensagem que o caso Cesare Battisti é “complexo e delicado” e “desperta sentimentos de participação na opinião pública” italiana (leia a íntegra da carta traduzida ao final desta reportagem).
Nesta sexta-feira (14), o presidente brasileiro determinou que o italiano seja extraditado para a Itália. A decisão foi tomada um dia após o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), revogar uma liminar (decisão provisória) que impedia a extradição de Battisti até que o Supremo voltasse a analisar o caso. O magistrado também decretou a prisão do italiano, que é considerado foragido pela Polícia Federal (PF).
A defesa de Battisti protocolou nesta sexta no Supremo um recursono qual pede a revogação da prisão preventiva do italiano decretada por Fux. Na mesma peça judicial, os advogados solicitam que a Suprema Corte proíba a extradição.
Após o anúncio da decisão de Temer, a defesa do italiano ajuizou no STF um novo documento para reiterar pedido para que o presidente seja impedido de extraditá-lo até que o recurso apresentado seja julgado pelo plenário do tribunal. Tecnicamente, o pedido pede “efeito suspensivo” ao recurso apresentado, ou seja, para que nenhum ato possa ser praticado.
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Decreto assinado pelo presidente Michel Temer autorizando a extradição de Battisi — Foto: Reprodução/’Diário Oficial’
“Senhor presidente, quero expressar meu mais sincero agradecimento pela decisão de Vossa Excelência sobre o caso do cidadão italiano Cesare Battisti, definitivamente condenado pela Justiça italiana por crimes gravíssimos e que até hoje se subtraiu à execução das relativas sentenças”, escreveu a Temer o presidente da Itália em trecho da carta enviada ao Palácio do Planalto.
Mattarella disse ainda ter apreciado muito a decisão do colega brasileiro, que, segundo ele, “ajuda a levar justiça às vítimas dos crimes pelos quais Battisti foi condenado na Itália.
“Na renovação dos sentimentos de amizade, a gratidão do nosso país, a minha pessoal, aproveito esta oportunidade para enviar-lhe meus melhores cumprimentos, juntamente com fervorosos votos para a iminente festividade”, concluiu o presidente italiano na carta.
Entenda o caso Batisti:
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Escritor e ex-integrante da organização de esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), Cesare Battisti é considerado foragido pelas autoridades brasileiras — Foto: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
- A novela de Cesare Battisti no Brasil teve início durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). O italiano fugiu para o Brasil para evitar uma extradição para a Itália, onde ele foi condenado à prisão perpétua por conta de quatro homicídios ocorridos no país europeu na década de 1970 por motivos políticos
- À época, Battisti fazia parte da organização Proletários Armados pelo Comunismo. Ele foi condenado pela Justiça italiana por quatro homicídios praticados entre 1978 e 1979 contra um guarda carcerário, um agente de polícia, um militante neofascista e um joalheiro de Milão (o filho do joalheiro ficou paraplégico, depois de também ser atingido). O italiano se declara inocente
- Antes de fugir para o Brasil, Battisti passou por outros dois países. Em 1981, ele conseguiu fugir da penitenciária de Frosinone, perto de Roma, onde cumpria pena pela morte do joalheiro, e se refugiou na França. No ano seguinte, ele se mudou para o México
- Battisti retornou para a França em 1990 e lá passou a atuar como escritor de livros policiais. Em 2005, ele decidiu deixar a Europa após o Conselho de Estado da França ter autorizado a extradição dele para a Itália. Logo em seguida, ele embarca para o Brasil
- Em 2007, o italiano foi preso pela Polícia Federal no Rio de Janeiro e passou a cumprir prisão preventiva aguardando uma posição final sobre o pedido de extradição apresentado por Roma ao Palácio do Planalto
- Battisti conseguiu obter do governo brasileiro, em 2009, o status de refugiado político, baseado no “fundado temor de perseguição por opinião política”, contrariando decisão do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare)
- No fim de 2009, o STF julgou “procedente” o pedido de extradição feito pela Itália, entretanto, deixou a palavra final ao presidente da República
- Lula negou a solicitação do governo italiano em 31 de dezembro de 2010, último dia do governo do petista. Battisti deixou a penitenciária da Papuda, em Brasília, em junho de 2011, após ficar quatro anos na cadeia à espera de uma posição das autoridades brasileiras sobre o pedido de extradição
- A decisão de Lula gerou mal-estar diplomático com a Itália, que se estendeu pelo governo Dilma Rousseff
- Roma não desistiu da extradição e retomou conversas com o Brasil após Temer chegar à Presidência em razão do impeachment de Dilma
- No momento em que identificou as movimentações diplomáticas entre Brasil e Itália, a defesa de Battisti se antecipou e pediu ao Supremo uma liminar para impedir a entrega do italiano para as autoridades do país europeu. Na ocasião, Fux concedeu a liminar, a mesma que ele revogou nesta semana
Bolsonaro
Apesar de ainda não ter assumido a Presidência da República, o presidente eleito Jair Bolsonaro já estava dando sinais às autoridades de Roma de que, assim que tomasse posse, iria determinar a entrega do italiano.
Nesta sexta-feira, dia seguinte ao despacho de Fux que mandou prender Battisti, o ministro do Interior italiano, Matteo Salvini, comentou em uma rede social a decisão do magistrado brasileiro e disse que apreciaria se Bolsonaro ajudasse o governo da Itália “presenteando” com a entrega do ex-militante de esquerda.
“Darei grande valor ao presidente @jairbolsonaro se ele ajudar a Itália a ter justiça, “presenteando” Battisti com um futuro na sua terra natal”, declarou o ministro italiano no Twitter.
No mesmo dia, Bolsonaro respondeu a Salvini pelo Twitter em uma mensagem escrita em português e italiano.
“Obrigado pela consideração de sempre, Senhor Ministro do Interior da Itália. Que tudo seja normalizado brevemente no caso deste terrorista assassino defendido pelos companheiros de ideais brasileiros! Conte conosco!”
Leia a íntegra da carta enviada pelo presidente italiano a Temer:
Roma, 14 de dezembro de 2014
Senhor Presidente,
Quero expressar meu mais sincero agradecimento pela decisão de Vossa Excelência sobre o caso do cidadão italiano Cesare Battisti, definitivamente condenado pela Justiça italiana por crimes gravíssimos e que até hoje se subtraiu à execução das relativas sentenças.
O gesto de Vossa Excelência constitui o significativo testemunho da antiga e sólida amizade entre Brasil e Itália e revela a sensibilidade para com uma situação complexa e delicada, que suscita sentimentos de intensa participação na opinião pública do nosso País.
Tenho grande apreço pela determinação da decisão de Vossa Excelência, que contribui a fazer justiça às vítimas dos delitos pelos quais Cesare Battisti foi condenado pelo Estado italiano.
Ao reiterar-lhe os sentimentos de amizade e gratidão meus e do nosso País, aproveito a ocasião para trasmitir a Vossa Excelência as mais cordiais saudações e os melhores votos para as iminentes festividades.
Assinado, Sergio Mattarella